Justiça Federal condena município de Itaituba e FNDE a regularizarem educação indígena no Médio Tapajós (PA)

Decisão aponta “omissão reiterada” e impõe obrigações para corrigir graves falhas estruturaisTelhado de uma das escolas — Créditos: Arquivo/Funai

A Justiça Federal julgou procedente, na quinta-feira (4), ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal (MPF) e condenou o município de Itaituba, o estado do Pará e o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) por violações continuadas ao direito à educação de comunidades indígenas no Médio Tapajós.

A sentença determina a construção imediata de escolas, a garantia de transporte e alimentação adequados, além da implementação do ensino médio na região.

A decisão abrange seis comunidades indígenas: Sawré Muybu, Dajeka PA, Waroy Iboybu, Praia do Mangue, Dacê Watpu e Praia do Índio. O juiz responsável classificou a situação como “omissão reiterada” e “inconstitucional”, reforçando que União, Estado e Município possuem responsabilidade solidária na garantia do direito fundamental à educação.


Precariedade e provas

A ação se baseou em ampla documentação mostrando a inexistência de condições mínimas de aprendizado nas aldeias. Segundo o MPF, faltam:

  • banheiros apropriados;
  • merenda e transporte escolar adequados;
  • oferta de ensino médio;
  • correta aplicação de recursos federais destinados à alimentação, transporte, manutenção e infraestrutura, material pedagógico e valorização profissional.

Um dos principais elementos da sentença é o Relatório Técnico nº 4/2024 da Funai, elaborado após vistoria presencial. O documento identificou:

Falhas estruturais

  • rachaduras em paredes e pisos;
  • ausência de energia elétrica;
  • inexistência de bibliotecas, laboratórios e salas de informática.

Execução inadequada

  • construção de unidades mínimas, com apenas duas salas, contrariando recomendações técnicas.

Irregularidades trabalhistas

  • uso de mão de obra indígena não qualificada;
  • relatos de possível participação de crianças no transporte de materiais.

Responsabilidades e condenações

A Justiça rejeitou os argumentos apresentados pelos réus.

  • Município de Itaituba: alegou que a Funai impediu a continuidade das obras, o que foi desmentido pela própria autarquia.
  • Estado do Pará: afirmou que a responsabilidade pela infraestrutura seria municipal, mas a tese foi negada pela Justiça, com base na responsabilidade solidária.
  • FNDE: admitiu que não fazia fiscalização desde 2016, sustentando que a competência seria de outros órgãos — argumento rejeitado pelo juiz.

Obrigações impostas pela sentença

Município de Itaituba

  • Construir unidades escolares completas nas seis aldeias.
  • Garantir alimentação e transporte escolar regulares.
  • Manter os serviços educacionais nas aldeias Datie Watpu, Boa-Fé, Sawré Muybu e Sawré Aboy.

Estado do Pará

  • Construir escolas (responsabilidade solidária).
  • Implementar o ensino médio na aldeia Sawré Muybu, com estrutura adequada e profissionais qualificados.

FNDE

  • Manter repasses financeiros ao município.
  • Fiscalizar a aplicação dos recursos destinados à educação indígena.
  • Adotar providências diante de irregularidades constatadas.

Danos morais coletivos

A Justiça reconheceu dano moral coletivo presumido, entendendo que a omissão prolongada violou gravemente a esfera moral das comunidades indígenas.

  • Itaituba e Estado do Pará foram condenados a pagar R$ 200 mil cada (total: R$ 400 mil).
  • Os valores devem ser aplicados em políticas públicas educacionais para o povo Munduruku, com execução coordenada pela Funai.

Fundamentação jurídica

A sentença reafirma parâmetros do Supremo Tribunal Federal (STF) segundo os quais o Judiciário pode intervir para assegurar direitos constitucionais negligenciados pelo poder público.

A decisão se baseia nos artigos 6º, 205 e 211 da Constituição Federal e na Convenção 169 da OIT, que garante a povos indígenas o acesso à educação em condições de igualdade.

Ação Civil Pública nº 1000402-48.2019.4.01.3908
[Consulta processual](https://pje1g.trf1.jus.br/consultapublica/ConsultaPublica/listView.seam)

Fonte: Estado Net

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