Consciência Negra: Centro de Educação Infantil realiza Feira Afrocentrada

Projeto “Entre tranças e histórias” reúne crianças, famílias e parceiros nacionais em ação antirracista no Cemei Maria Raimunda, no bairro Nova RepúblicaDivulgação 

Uma menina que não gostava do próprio cabelo, evitava olhar para a própria pele e sonhava em “trocar de cor”. Essa poderia ser só mais uma história marcada pelo racismo estrutural, mas, no Cemei Maria Raimunda Pereira de Sousa, em Santarém, virou ponto de virada.

A partir do contato com livros da Afroteca Lelê, a pequena Emanuele se reconheceu na personagem, ressignificou seu cabelo crespo, aprendeu a se amar e hoje tem até um livro contando sua própria trajetória.

Esse tipo de transformação foi o foco da Feira Afrocentrada “Entre tranças e histórias”, realizada na manhã deste sábado (29) pelo Centro Municipal de Educação Infantil, no bairro Nova República, em alusão ao mês da Consciência Negra.

O evento teve como objetivo valorizar a cultura afro-brasileira e fortalecer uma educação antirracista desde a primeira infância, com atividades lúdicas, artísticas e culturais envolvendo crianças, educadores, famílias e a comunidade.

“Nós conseguimos quebrar o preconceito da própria criança que não se aceitava. A Afroteca tem nos ajudado com essas crianças. Nosso objetivo é enfrentar o racismo estrutural na primeira infância, para que a criança se reconheça e se ame como é, com suas características africanas, sabendo que é linda do mesmo jeito. Isso, pra gente, é muito gratificante”, destacou Janice Diniz, coordenadora do Cemei Maria Raimunda.

Presenças nacionais e reconhecimento das boas práticas

Aberta à comunidade escolar, a Feira Afrocentrada contou com a presença de:

  • Nilton Araujo, secretário municipal de Educação de Santarém;
  • Wiliams Valentim, representante da Universidade de Brasília (UnB);
  • Jefferson Acácio, representante do Ministério da Igualdade Racial;
  • Claudete Abreu, representante da Afroliq.

A ação é a culminância de um trabalho realizado ao longo do ano com base na Lei 10.639/03, que torna obrigatório o ensino de História e Cultura Africana e Afro-Brasileira nas instituições de ensino.

Wiliams Valentim, que está em Santarém desenvolvendo a pesquisa “Educando para o Antirracismo”, em convênio entre UnB e MEC, classificou a experiência como referência nacional:

“Estamos registrando boas práticas de educação antirracista em vários municípios. Aqui, no Cemei e no quilombo do Bom Jardim, vemos experiências que fortalecem a identidade nacional e a identidade negra desde a infância. Cerca de 75% da população do Pará é negra ou parda. Não podemos esconder nossa história; temos que ser narradores desse novo tempo. Parabéns a todos”, ressaltou.

Lei 10.639/03 saindo do papel

Para o representante do Ministério da Igualdade Racial, Jefferson Acácio, a Feira Afrocentrada mostra, na prática, o que muitas vezes fica apenas no texto da lei:

“A Lei 10.639 é obrigatória, mas ainda enfrenta muitos desafios de implementação. Encontrar aqui, na educação infantil, esse trabalho concreto, interseccional, articulando outras políticas para fortalecer as infâncias, é algo que também fortalece a nossa própria construção. Desde o começo da vida, já é possível consolidar identidade e pertencimento”, afirmou.

Ele destacou ainda que, dentro da pasta, tem atuado na construção de estratégias de política social integrada, com foco na valorização da história e da cultura afro-brasileira.

Compromisso da rede municipal de Santarém

O secretário municipal de Educação, Nilton Araujo, reforçou que a pauta antirracista não pode ser pontual, mas contínua no cotidiano escolar:

“Independentemente da cor ou da forma de pensar, precisamos trabalhar essa consciência desde a educação infantil. Enquanto Semed, vamos incentivar cada vez mais essa mentalidade”, afirmou.

Nilton adiantou que, em janeiro, a secretaria deve realizar um circuito de formações internas sobre a Lei 10.639/03, voltado a todos os técnicos da Semed:

“Queremos que não apenas o núcleo específico, mas toda a equipe técnica esteja preparada para disseminar esse conhecimento nas escolas. Nosso objetivo é construir uma educação em que respeito e dignidade sejam realidade”, concluiu.

A Feira Afrocentrada, ao reunir crianças, famílias, educadores e instituições parceiras, reforça a mensagem de que **combater o racismo começa cedo, na sala de aula, na roda de leitura, nos penteados, nas histórias e na forma como cada criança aprende a olhar para si e para o outro.**

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