Governo vence batalha do IOF, mas arrisca perder a guerra política com o Congresso, avalia cientista político

Capacidade de pressão do Congresso Nacional afetar governabilidade
Hugo Motta, Lula e Davi Alcolumbre | Foto: Ricardo Stuckert

Por trás da recente vitória simbólica do Governo Federal na narrativa em torno da proposta de aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), rejeitada pelo Congresso Nacional, está uma batalha mais ampla e complexa. Para o cientista político Guilherme Carvalho, o Executivo pode até ter conseguido ativar suas bases de apoio e sensibilizar parte da opinião pública, mas enfrenta uma crescente deterioração nas relações com o Legislativo que ameaça comprometer sua governabilidade até o fim do mandato.

“Acho que é de fato uma batalha que foi vencida no campo da opinião pública já ativada. Agora, a grande questão é o quanto esse debate sobre o IOF está realmente politizado. O quanto ele chegou às camadas mais profundas da sociedade para que a gente possa medir e dizer que o PT realmente venceu essa queda de braço”, pondera o analista.

A proposta do Executivo previa um aumento gradual das alíquotas do IOF sobre operações de crédito, com o objetivo de ampliar a arrecadação em até R$ 12 bilhões em 2025. O plano foi barrado pela maioria do Congresso, sob o argumento de que representaria aumento da carga tributária em um contexto de desaceleração econômica e alta pressão inflacionária. A medida, de acordo com o governo, visava financiar programas sociais e conter o déficit fiscal.

No entanto, para Guilherme Carvalho, a tentativa do governo de transformar esse embate em uma bandeira ideológica contra o Congresso — e de judicializar a disputa ao acionar o STF — revela mais fragilidades do que forças. “Ter acionado o Supremo para entrar nessa briga pode tornar a disputa ainda mais complexa. Temos um ano e meio de governo ainda, e a questão que se coloca é: como manter relações minimamente operacionais com o Legislativo até lá?”

Repetição de um erro?

A estratégia de polarização e mobilização digital adotada pelo Planalto em torno do IOF lembra, segundo Carvalho, a postura do ex-presidente Jair Bolsonaro no início do seu mandato, quando também apostou em confrontos com o Congresso e o STF como forma de consolidar sua base de apoio. “Ficar nessa batalha para tentar polarizar por meio das redes sociais foi uma estratégia que Bolsonaro tentou lá no começo e deu errado”, afirma.

O cientista político destaca que, apesar da narrativa progressista adotada pelo PT, a atual composição do Congresso é majoritariamente conservadora e refratária a aumentos de impostos. Isso cria um ambiente de pressão constante sobre o governo, que detém apenas uma base minoritária e fragmentada no Legislativo. “Você ganha eventualmente a batalha, mas pode perder a guerra porque o Congresso tem pontos de pressão mais bem distribuídos. Os freios e contrapesos estão muito mais pulverizados e fragmentados na opinião pública.”

Na prática, isso significa que, mesmo que o Executivo consiga vitórias pontuais ou controle a agenda do noticiário em determinadas semanas, o Congresso pode obstruir pautas centrais, barrar indicações, retardar votações importantes e impor medidas que restrinjam ainda mais a margem de manobra fiscal do governo.

Imposto estratégico, mas pouco compreendido

O IOF é um imposto federal de caráter extrafiscal e regulatório. Incide sobre operações de crédito, câmbio, seguros e títulos financeiros, podendo ter suas alíquotas alteradas por decreto presidencial. Essa flexibilidade permite que o governo o utilize como instrumento de política econômica, para incentivar ou desestimular determinados comportamentos no mercado financeiro.

No entanto, seu aumento, especialmente em operações de crédito, tem impacto direto sobre consumidores e empresas, elevando o custo de empréstimos e financiamentos. A tentativa do governo de elevar a alíquota em 2025 para até 3,5% foi rechaçada pelo Congresso sob o argumento de que penalizaria a classe média e os setores produtivos em um momento de crescimento lento.

Com a rejeição da proposta, o governo enfrenta agora um rombo estimado entre R$ 10 e R$ 12 bilhões em 2025, o que pode elevar o contingenciamento orçamentário de R$ 31,3 bilhões para até R$ 43 bilhões. Programas sociais como o Auxílio Gás, o Minha Casa Minha Vida e até as emendas parlamentares — cerca de R$ 9,8 bilhões — podem ser diretamente afetados.

Fonte: Jornal Opção 

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